Aspectos polêmicos sobre a MP 927

A pandemia mundial do Covid-19 (Coronavírus) rapidamente chegou ao Brasil e demandou, dos chefes do Poder Executivo, medidas drásticas e rápidas visando o achatamento da curva de contaminação, o colapso do sistema de saúde e a diminuição do número de vítimas. Foi determinado, dentre outras medidas, o fechamento do comércio em geral, bares, restaurantes, academias, […]

A pandemia mundial do Covid-19 (Coronavírus) rapidamente chegou ao Brasil e demandou, dos chefes do Poder Executivo, medidas drásticas e rápidas visando o achatamento da curva de contaminação, o colapso do sistema de saúde e a diminuição do número de vítimas.

Foi determinado, dentre outras medidas, o fechamento do comércio em geral, bares, restaurantes, academias, lojas, shoppings, etc. Apenas os serviços considerados essenciais têm autorização para funcionar, como hospitais, padarias, farmácias, supermercados, bancos, por exemplo.

Assim, muitas empresas passaram a amargurar uma queda abrupta em seus faturamentos.

Visando auxiliar os empregadores a manter os vínculos empregatícios, foi editada, em 22/03/20, a Medida Provisória – MP 927, que elencou algumas possibilidades no art. 3º, dentre elas, o teletrabalho, a antecipação de férias e feriados, a concessão de férias coletivas, o banco de horas e a suspensão do contrato de trabalho pelo prazo de até 04 (quatro) meses.

De todas as opções, a última foi duramente criticada pelos especialistas e pela população em geral e, no dia seguinte, o Governo Federal editou a MP 928 que, dentre outros aspectos, cuidou de revogar o art. 18 da MP 927, que tratava justamente da suspensão do contrato de trabalho com o encaminhamento do empregado para um curso de qualificação profissional.

Agiu acertadamente o governo, nesse ponto, na medida em que a suspensão do contrato de trabalho poderia equivaler ao não recebimento de salários pelo empregado por até quatro meses, acarretando sérias dificuldades, dentre as quais, a mais grave seria a fome.

Superado esse ponto muito polêmico, surgiram muitas dúvidas porque, em alguns aspectos, a MP 927 foi omissa.

A redação do art. 2º, que confere primazia aos acordos individuais sobre os coletivos e a lei, levantou um debate sobre a possibilidade de redução dos salários.

Mas acredita-se que tal redução salarial não é possível, por algumas razões. Primeiro porque, se assim quisesse, teria o Governo Federal expressamente citado essa opção no rol de medidas do art. 3º. Segundo, porque o art. 503 da CLT, que trata da redução salarial de até 25% (vinte e cinco por cento) não foi recepcionado pela CRFB/88. Terceiro, porque a Carta Magna é expressa ao dispor em art. 7º, VI, a irredutibilidade salarial, salvo nas hipóteses de acordo ou convenção coletiva.

Portanto, a redução salarial somente poderá ocorrer mediante acordo ou convenção coletiva que disponha expressamente nesse sentido. E mais, deverá haver uma contrapartida do empregador, como exemplo, a redução proporcional da jornada – sob pena de se caracterizar alteração contratual lesiva, nos termos do art. 468 da CLT.

Outro ponto que gerou dúvida aos empregados, foi o fato de a empresa conceder férias que já estavam programadas antes mesmo da decretação do estado de calamidade, mas não efetuar o pagamento com dois dias de antecedência, conforme prevê o art. 145 da CLT.

Nesses casos, ao que parece, o empregador agiu em desacordo com o disposto na MP 927, que é expressa ao diferir, para o mês seguinte, somente o pagamento daquelas férias que forem concedidas em virtude da calamidade, nos termos do art. 9º da referida medida provisória.

Um terceiro ponto que gerou polêmica foi a omissão da MP 927 quanto à suspensão da prescrição do direito de ação durante o prazo da calamidade.

Isso porque, quanto aos créditos relativos ao FGTS e prazos de defesa e recurso em procedimentos administrativos, a medida provisória foi expressa ao dispor, no art. 28, que eles estariam suspensos pelo prazo de 6 (seis) meses.

Razoável, seria, a suspensão do prazo prescricional ao menos durante a suspensão dos prazos determinada pelo CNJ até o dia 30/04/20, já que ainda existe a possibilidade de o particular ingressar no Judiciário com Reclamação Trabalhista comparecendo ao prédio da Justiça do Trabalho, que hoje está fechado.

Por derradeiro, dois outros pontos que geraram polêmica foram os arts 30 e 36.

O art. 30 prevê a hipótese de os acordos e as convenções coletivos vencidos ou vincendos, no prazo de cento e oitenta dias, a partir de 22/03/20, poderão ser prorrogados, a critério do empregador, pelo prazo de noventa dias. Nesse caso, a crítica se deve ao fato de que é da essência de negociação coletiva a participação dos sindicatos, de forma que, essa decisão unilateral do empregador feriria a autonomia dos sindicatos garantida pelo art. 8º da CRFB/88.

Já o art. 36 considera convalidadas as medidas trabalhistas adotadas por empregadores tomadas no período dos trinta dias anteriores à data de entrada em vigor. Como poderia uma medida provisória regulamentar uma situação pretérita à sua edição. Salvo melhor juízo, a MP 927 não poderia validar fatos anteriores à sua vigência, sob pena de violar o princípio da irretroatividade das normas jurídicas.

Esses foram alguns pontos polêmicos apontados pela comunidade acadêmica no que tange à medida provisória, já que, em relação ao teletrabalho, à antecipação de férias e feriados, férias coletivas e banco de horas, caminhou bem o poder executivo, visto que a situação repentina e excepcional demandou a alteração de algumas regras e prazos previstos na CLT, o que é perfeitamente razoável, dada a complexidade do cenário.

Essas são algumas observações pertinentes acerca da MP 927. Em breve, serão feitas outras considerações.

Adriesley Esteves de Assis – OAB.ES nº 14.596

alvaro@appa.com.br

Álvaro Augusto Lauff Machado